Rómulo faria hoje um Século de vida

(por isso, vamos assassinar-lhe a produção mais famosa... com a devida vénia)

Eles não sabem que o sonho
é uma constante da vida
tão concreta e definida
como outra coisa qualquer,
como esta bola Mikasa
com que eu jogo e lanço,
como este ribeiro manso
em serenos sobressaltos,
como estes postes tão altos
que em branco e oiro se agitam,
como estas aves que gritam
em bebedeiras de azul.

Eles não sabem que o sonho
é vinho, é espuma, é fermento,
jovem atleta sedento,
curioso e raçudo,
que pretende ganhar tudo
num perpétuo movimento.

Eles não sabem que o sonho
é misto, saia, calção,
braçadeira de capitão,
arco em ogiva, vitral,
pináculo de catedral,
contraponto, sinfonia,
defesa, ataque, magia,
que é retorta de alquimista,
lançamento na passada,
carregar base pesada,
caravela quinhentista,
jogada de deslumbrar,
ouro, canela, marfim,
florete de espadachim,
ter um árbitro a apitar,
Colombina e Arlequim,
passarola voadora,
colectivo, treinador,
jogadora, jogador,
alto-forno, geradora,
cisão do átomo, radar,
ultra-som, televisão,
desembarque em Roterdão,
qual superfície lunar.

Eles não sabem, nem sonham,
que o sonho comanda a vida,
que sempre que um homem sonha
o mundo pula e avança
como bola colorida
entre as mãos de uma criança.