Blog do Avô

O Primeiro Blogue sobre Corfebol (mas não só) em Portugal!

quinta-feira, abril 07, 2005

Branca de Neve

Eugénia Rainha (se calhar era da família do Castro) era a melhor jogadora de Corfebol do Mundo. Os seus rendimentos de atleta profissional permitiam-lhe viver num palácio sumptuoso, rodeada de luxo e lacaios.
Como prémio de melhor jogadora num torneio organizado pela Hansa das Feiticeiras, recebeu um dia um espelho mágico que respondia sempre à mesma pergunta – “Espelho, espelho meu, existe alguma jogadora melhor do que eu?” – com a mesma resposta – “Não. Tu és a melhor jogadora do Mundo”.
O palácio estava cheio de referências ao Corfebol. Entre troféus e fotografias emolduradas, em todo o lado se podiam encontrar bolas e cestos. Os empregados, impelidos por tanta solicitação, jogavam amiúde entre si, cada vez que tinham uma pausa no trabalho – fosse ela concedida pela patroa ou conquistada com um estalar de Kit-Kat.
Branca trabalhava para Eugénia Rainha (a quem passaremos a chamar só Rainha para facilitar a nossa vida e a vossa) e, entre os colegas, ganhou o gosto de mandar bolas ao cesto. Tornou-se até um vício.
Cedo se percebeu que estava ali uma jogadora com potencial. Um dos camareiros, que tinha sido treinador quando era mais novo, encarregou-se de a treinar e motivar para se inscrever num clube e jogar aos fins de semana.
Assim foi e, para abreviar a história, chegamos a um ponto em que Branca jogava já nas competições regulares e bolas! como ela era boa!
Devido ao seu estatuto de estrela, Rainha só jogava no final da época, em jogos decisivos, ou então em competições internacionais. Ausente dos campos, nunca tinha visto Branca jogar no dia em que o espelho a surpreendeu.
Claro que vocês já sabem o que é que se vai passar agora. bláblá a Rainha perguntou ao espelho bláblá e o espelho desta vez não deu a resposta do costume bláblá porque há sim, alguém que joga melhor que a Rainha, bláblá a Rainha fica furibunda taltal...
Sabendo que a usurpadora trabalhava para si, ao abrigo do novo Código da Trabalho, transferiu-a para a sua casa de campo, onde raramente ia. Era uma casa que tinha sido pensada para esquecer o Corfebol por completo, caso alguma vez sentisse essa necessidade. Não se falava em Corfebol num raio de muitos quilómetros em volta. Era o sítio ideal para pôr Branca a trabalhar!
Com pena dela, os colegas, sem que a Rainha percebesse, deram-lhe como prenda de despedida um livro de regras e o livro de introdução à modalidade escrito pelo triunvirato de notáveis Granja-Ramos-Ferro.
Passou alguns meses de puro tédio, sem trabalho, porque a casa não era utilizada, e sem Corfebol. Era como aqueles quadros de empresas públicas que são colocados na prateleira até darem em doidos e rescindirem sem direito a indemnização.
Um dia, passaram-lhe à porta 7 homens baixinhos, cabisbaixos, tristes porque vinham de um treino de captação de Basquete e, mais uma vez!, não os tinham deixado ficar na equipa por causa do défice de altura. Branca, inteirada da razão de tal desânimo, ofereceu-lhes um chá e mostrou-lhes os livros que tinha sobre Corfebol.
Os homenzinhos acharam piada e resolveram experimentar. Montaram um cesto improvisado no quintal da casa e compraram uma bola de futebol. Passaram a treinar regularmente e o entusiasmo com a modalidade foi crescendo.
A certa altura, já dominadores dos preceitos básicos do Corfebol, resolveram inscrever-se nas competições. Nunca tinha havido uma equipa de tal desporto naquela região, mas a novidade até foi boa quando chegou o momento de pedir apoios.
3 dos homenzinhos foram à Corporación Dermoestética e fizeram uma operação para mudar de sexo. Assim estava certo: 4+4.
Começaram a jogar. E a ganhar. E a Branca era de novo a melhor. E o espelho, que é como o algodão, não engana. E a Rainha furibundizou-se outra vez. Ainda por cima, vinha aí o Campeonato do Mundo, que até se ia realizar no pavilhão privativo do seu palácio, e não haveria outra qualquer a fazer-lhe sombra na Selecção.
Mas desta vez resolveu tratar do assunto pessoalmente. Aproveitando um jogo em que a equipa da Branca ia jogar com a sua, foi jogar com um intuito perverso. Sem ninguém se aperceber, trocou-lhe a garrafa de Isostar por outra com líquido dopante. Como tinha boas relações na Federação, pediu um controlo surpresa e a Branca foi irradiada de toda a competição.
Triste, desanimada, incrédula com tudo o que se tinha passado, voltou para a casa de campo com os anões e as anonas (uma anã é o feminino de anão, eu sei, mas estas eram transexuais, por isso posso chamá-las anonas, ok?).
Despejava uma garrafa de gin ao pequeno almoço; esgotou o stock de ervinhas para rir que tinha trazido por brincadeira numa das viagens que fez à Holanda; parecia uma chaminé, tal era o fumo que ingeria e expelia, cigarro após cigarro, e tal era a negritude do seu corpo, sem sentir água limpa durante meses a fio. Quanto mais se aproximava a data do Mundial, mais deprimida se sentia, e ali ficava, zombie, a olhar a estrada que passava defronte da casa de campo.
Até que essa mesma estrada, a mesma que tinha mudado a sua vida quando encontrou os anões, foi responsável por uma segunda viragem na sua vida. Num Mercedes branco, um homem estrangeiro, nitidamente bem posto na vida, parou a perguntar o caminho para a fronteira.
Era o Presidente de uma Federação estrangeira, que tinha abandonado o Mundial ainda antes de começar por se sentir mal tratado pelo Comité Organizador, presidido pela Rainha. Esta, apesar de jogadora, tinha centrado em si toda a organização do Mundial e menosprezava a presença de delegações estrangeiras. Vários incidentes levaram a que aquele Presidente tivesse retirado a sua Selecção da competição e agora voltava para casa, onde ia redigir uma exposição à IKF.
Como em todos os contos de fadas, e apesar do aspecto fétido da Branca, apaixonaram-se à primeira vista. Branca contou a sua história ao Presidente e este convidou-a a seguir consigo para o seu País, onde a irradiação não tinha efeito. Montados no Mercedes branco seguiram estrada fora (a tal que muda vidas... sentem o peso simbólico desta metáfora? Quase que choro de pensar na cena... Será que alguém adapta isto para o Cinema?).
Casaram-se, claro, e Branca voltou a jogar. Voltou a ser a melhor do Mundo. A Rainha partiu o espelho e lesionou-se com recuperação prevista para 7 anos.

3 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Não gostei muito do Patinho Feio nem dos 3 Porquinhos. Adorei as metáforas do Capuchinho Vermelho e da Branca de Neve.
Está um espanto!
A pergunta do espelho, as referências ao código do trabalho e ao kit kat, o Mercedes em vez do cavalo branco, etc., mas o que gostei mais foi do Isostar com doping a substituir a maçã e da operação ao sexo dos anões/anonas.
Muito giro!

quinta-feira, 07 abril, 2005  
Anonymous Anónimo said...

:-))

quinta-feira, 07 abril, 2005  
Anonymous Anónimo said...

Era uma vez o Avô Continhos e os seus oito netinhos.
Ele sentava-se num velho banco de verga a contar histórias.
Os seu netos, quatro rapazes e quatro raparigas, sentavam-se em banquinhos de plástico amarelos a ouvir.
As histórias do Avô nunca agradavam a todos. No entanto todos esperavam, com impaciência, pelo próximo Conto.

terça-feira, 12 abril, 2005  

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