Hawwa (*)
O Sr. Adão trabalhava na Pensão Paraíso. Trabalhar, trabalhar, não era bem o caso, porque não havia clientes. O Patrão dizia-lhe que não era ainda tempo e lá ia o Sr. Adão passando a existência a ver televisão.
Adorava desporto. Devorou o Euro 2004 (até tem uma bandeira de Portugal na varanda da pensão, apesar de ninguém a ver) e os Jogos Olímpicos. Nos intervalos mandava uma bola de trapos às paredes. Bem pedia ao Patrão para lhe arranjar companhia para jogar à bola, mas nada!
Até que um dia, num momento mais aceso do seu jogo solo, em que estava quase a ganhar a si mesmo, caiu e partiu uma costela.
O Patrão, que não gostava de desperdícios, da costela fez Hawwa, uma companheira para o Sr. Adão.
De início este não ficou satisfeito. Barafustou que não podia jogar com uma mulher, que estas só serviam para se pintarem, enroladas em bandeiras, para deleite dos realizadores de televisão.
Para além da costela, o Sr. Adão tinha dado cabo da cesta da fruta que, no lobby, eternamente esperava os visitantes inexistentes, espalhando a fruta toda pelo chão. Tinha também estilhaçado um candeeiro de pé alto, cuja luz, sempre apagada, aguardava até então por quem viesse.
O Patrão exigiu-lhe que se entendesse com Hawwa e que desse uso ao que estragara, em nome do não desperdício.
Adão e Hawwa acabaram por se tornar bons amigos. Inventaram um jogo em que ambos pudessem jogar ao mesmo tempo e prometeram que os seus filhos e filhas o jogariam sempre juntos. A cesta de fruta foi posta no topo do pé alto do candeeiro, para onde se deveria atirar a bola de trapos. Os cacos do candeeiro simbolizavam os prémios. Os prémios eram cacos para evitar a disputa excessiva pelos troféus, lembrando que a vitória é mais efémera que os bons princípios do desportivismo e da amizade.
Quando acabaram de escrever o regulamento desse novo jogo, sentaram-se a descansar. Hawwa viu uma maçã, ainda a um canto após o incidente com a cesta da fruta, e comeu-a.
E o estômago doeu-lhe.
E ainda hoje dói, às vezes.
E sempre que dói, algum dos seus filhos esquece a alegoria dos cacos e desdenha o Velho Regulamento, que muitos já querem substituir por um radical Novo Regulamento.
(* Hawwa – “a Mãe de todos os viventes”, em Hebreu)
Adorava desporto. Devorou o Euro 2004 (até tem uma bandeira de Portugal na varanda da pensão, apesar de ninguém a ver) e os Jogos Olímpicos. Nos intervalos mandava uma bola de trapos às paredes. Bem pedia ao Patrão para lhe arranjar companhia para jogar à bola, mas nada!
Até que um dia, num momento mais aceso do seu jogo solo, em que estava quase a ganhar a si mesmo, caiu e partiu uma costela.
O Patrão, que não gostava de desperdícios, da costela fez Hawwa, uma companheira para o Sr. Adão.
De início este não ficou satisfeito. Barafustou que não podia jogar com uma mulher, que estas só serviam para se pintarem, enroladas em bandeiras, para deleite dos realizadores de televisão.
Para além da costela, o Sr. Adão tinha dado cabo da cesta da fruta que, no lobby, eternamente esperava os visitantes inexistentes, espalhando a fruta toda pelo chão. Tinha também estilhaçado um candeeiro de pé alto, cuja luz, sempre apagada, aguardava até então por quem viesse.
O Patrão exigiu-lhe que se entendesse com Hawwa e que desse uso ao que estragara, em nome do não desperdício.
Adão e Hawwa acabaram por se tornar bons amigos. Inventaram um jogo em que ambos pudessem jogar ao mesmo tempo e prometeram que os seus filhos e filhas o jogariam sempre juntos. A cesta de fruta foi posta no topo do pé alto do candeeiro, para onde se deveria atirar a bola de trapos. Os cacos do candeeiro simbolizavam os prémios. Os prémios eram cacos para evitar a disputa excessiva pelos troféus, lembrando que a vitória é mais efémera que os bons princípios do desportivismo e da amizade.
Quando acabaram de escrever o regulamento desse novo jogo, sentaram-se a descansar. Hawwa viu uma maçã, ainda a um canto após o incidente com a cesta da fruta, e comeu-a.
E o estômago doeu-lhe.
E ainda hoje dói, às vezes.
E sempre que dói, algum dos seus filhos esquece a alegoria dos cacos e desdenha o Velho Regulamento, que muitos já querem substituir por um radical Novo Regulamento.
(* Hawwa – “a Mãe de todos os viventes”, em Hebreu)
3 Comments:
que bonita alegoria! parabéns avô.
Então não foi o Adão que comeu a maçã?
Os homens ficaram com a chamada Maçã de Adão no pescoço, não foi?
JCM
Depois das Velhinhas que iam a casa da Filipa falar da religião 'Corfebolística', temos agora o Pecado Original da criação do Corfebol.
Tantas alegorias que deixam entender que é preciso ter FÉ para (sobre)viver neste barco...
/PV
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