Blog do Avô

O Primeiro Blogue sobre Corfebol (mas não só) em Portugal!

sexta-feira, junho 06, 2008

Selecção Non-Stop

Não assisti directamente, mas ouvi dizer que, quando a selecção nacional de futebol foi recebida pelo Presidente da República, um dos jornalistas que acompanhava o directo televisivo terá dito algo como “agora o Presidente da República vai ter a honra de cumprimentar os jogadores”.
O absurdo é de tal forma plausível que não questiono a sua veracidade.

O futebol é o desporto das massas e da massa (já viram que, só para pagar aos árbitros, vão ser 28 mil euros por jogo?!). Não questiono a pertinência de lhe ser dado um destaque que outros desportos ou outras áreas sociais estão longe de ter. Mas tudo o que é demais enjoa.

Estava de televisão ligada quando, no passado Domingo, dois canais transmitiam um directo que vai contra todos os manuais de jornalismo e gestão de espaço televisivo. Era um total anti-clímax.
Mostrava-se o átrio de “um hotel em Oeiras”, onde a selecção pernoitou entre Viseu e a partida para a Suiça. Os jornalistas espremiam tudo o que lhes cheirasse a informação. As perguntas da praxe sucediam-se, cansativas, enjoativas. Os planos pasmacentos, onde nada havia a mostrar, entravam-nos pelas casas adentro, alternando entre um autocarro vazio e um punhado de adeptos que espreitavam a porta do hotel com ar de quem não tinha mesmo nada mais interessante para fazer num final de manhã domingueiro.
A certa altura, o clímax! O Deco saiu do hotel e foi ao autocarro ver (ou buscar? ou levar?) qualquer coisa. Foram uns enormes 15 ou 20 segundos em que passou pela multidão de 7 ou 8 gatos-pingados, percorreu longos 4 ou 5 metros, entrou no autocarro e logo voltou para trás, sem prestar declarações, sem assobiar a Macarena, sem citar Goethe, sem dançar o tango, sem beijar um caniche, sem mostrar um piercing no pénis.
Nada! O homem nada fez, a não ser ir ao autocarro e voltar depressinha para o hotel. Mas a euforia instalou-se entre os jornalistas. Finalmente uma “notícia” (carreguem nas aspas, ou ainda tenho a Estrela Serrano a bater-me à porta). E então, espremeram o aparecimento do Deco até à exaustão. Entrevistaram os adeptos, que não se mostraram muito entusiasmados, tentando sacar depoimentos sobre as emoções sentidas por ter tido ali um jogador a passar por entre eles. Tudo bem que não era o Cristiano Ronaldo, mas o pessoal bem que podia ter tido mais respeito pelo trabalho dos jornalistas.
Fartei-me de tanta imbecilidade e, entre ofensas a mim próprio por ter aguentado aquilo durante penosos minutos, desliguei a televisão.

Mas sei hoje o que se seguiu. Leio-o, ouço-o. Muitos opinadores e cronistas mantiveram os olhos na TV. Muitos viram para hoje dizer mal. A exemplo do Big Brother, de que ninguém gostava mas todos viam para poder criticar, assim são os directos exaustivos sobre a selecção de todos nós – todos os vemos, para depois nos revoltarmos contra eles.
O que se seguiu foi mais do mesmo. Nada. Pacotes de nada. Resmas de nada, durante horas a fio.
Um avião parado na pista. Descrição do avião. Planos de pormenor do avião. Um jogador que acena. Descrição do aceno. Planos do público para quem acenou. Um outro que fala ao telemóvel. Especulação sobre com quem falaria. Especulação sobre qual será o toque do telemóvel daquele jogador. Entrevistas. Vox pop no seu melhor. Perguntas de chacha. Mais chacha. Mais palha de encher programação.

Pior que estes directos, de que não vi nem 10% mas que não me custa imaginar, só um outro que também vi parcialmente: o da partida dos McCain para Inglaterra.
Foi um lixo tão grande que me provocou um abaixamento maior do maxilar inferior e um esbugalhar mais dilatado dos olhos do que se a Angelina Jolie me passasse nua a meio metro de distância.

Pobres jornalistas que se prestam a estas provações. Ter de descrever o que se vê, mesmo quando nada se vê. Ter de encontrar sumo numa uva passa. Ter de retirar informação de um avião à espera de levantar voo.
Tenho pena deles, a sério, mas não mais do que a que sinto de um País que se aliena com esta facilidade.
Ri-se o Sócrates, que varre para debaixo do tapete televisivo os preços da gasolina, que esconde atrás do sofá futebolístico as críticas do Alegre, que oculta dentro do saco jornalístico os números do desemprego.

Vibrarei como qualquer português. Torcerei pelo sucesso dos nossos. Que nos orgulhem. Que orgulhem os que fugiram deste país sem oportunidades e vivem por aí fora, particularmente na Suiça.
Vibrarei. Sofrerei. Torcerei. Mas não me apanharão a colar as retinas ao televisor à espera de ver se o Ronaldo entra no autocarro com o pé direito ou o esquerdo.

Agora vamos aos turcos!