Blog do Avô

O Primeiro Blogue sobre Corfebol (mas não só) em Portugal!

terça-feira, fevereiro 10, 2009

Morrer Duas Vezes

A discussão sobre a interrupção ou não da vida (?) de Eluana Englaro acabou com a morte da rapariga (?). Questiono as palavras “vida”, porque não a tinha, e “rapariga”, porque só tinha vivido 21 anos, apesar de já ter 38.
O resto do tempo não viveu. Vegetou. Sofreu. Prolongou o sofrimento de quem de si gostava. Morreu duas vezes. Dor e pesar na primeira, sofrimento permanente no tempo intermédio, alívio de quem enterrou finalmente uma angústia constante na segunda morte.
Os italianos continuaram a discutir tudo o que envolveu este caso polémico, mas foi-lhes retirada a premência de decidir. Agora voltam as discussões académicas, os editoriais de jornal, as erudições de convidado televisivo, os opinativos de blogue. Mas já não há votação para saber se os médicos podem ou não podem retirar a alimentação à malfadada jovem, se têm razão os familiares, os juízes, os médicos, os políticos, os jornalistas, os peritos, os conversadores de tasca.
Adia-se, mais uma vez, uma decisão, a formulação de uma lei. É mais fácil debater o tema, mais ou menos efusivamente, do que lhe pôr o preto no branco. E assim vamos andando, até que uma outra Eluana apareça, na Itália de Berlusconi ou no Portugal do Cardeal Policarpo.
Até lá, quem tiver o azar de morrer sem morrer terá de morrer duas vezes, matando quem o rodeie tão lentamente quanto lenta for a sua agonia. Quem sofrer de desesperança, somada ou não a lancinante dor física, terá de esperar que lhe dê alívio o corvo final, a ceifeira das vidas, que deixou o trabalho a meio da primeira vez.

sábado, janeiro 31, 2009

Crónica de Actualidade

Chove.
Chove. Pôrra, como chove!

sexta-feira, janeiro 23, 2009

Grandes Desafios

248/2008
Prometida havia muito tempo, sempre no forno, já prontinha, mas a precisar de um último aquecimentozinho que parecia eterno, a Lei lá saiu, com o número 248 de 2008. Sim, de 2008, porque, para fazer um manguito aos que diziam que o Governo não a punha cá fora antes do final do ano, lá veio ela, garbosa, orgulhosamente datada de… 31 de Dezembro.
A Lei, que é um Decreto-Lei, se formos rigorosos, divide-se em duas partes – a A e a B, assim como muitos dos nossos clubes se dividem em equipas.

248-A/2008
Pois o 248-A até veio em boa altura. Este documento, que “estabelece o regime de acesso e exercício da actividade da actividade de treinador de desporto”, caiu na altura certa para a FPC. É que, depois de se andar às voltas com o enquadramento perfeito para os nossos treinadores, de se fazerem documentos preparatórios, reuniões, debates informais com os gurus do costume, passando-se a pasta de Comissão Técnica para Comissão Técnica, de Direcção para Direcção, eis que finalmente surge fumo branco na tentativa de arrumar a questão de uma vez por todas. Mesmo em cima do 248-A.
Pode não ser o documento sonhado durante anos, mas tem a grande virtude de ter saído da gaveta cá para fora. Mérito aos autores, que avançaram, que deram o peito às balas. E essas, as balas, é óbvio que teriam de surgir. Umas mais pertinentes que outras, como será sempre óbvio.
Resta-lhes, aos peitos dados às balas, não as rechaçarem para longe. Que as encaixem no peito e devolvam ao destino mais adequado, com a precisão de um Cristiano Ronaldo. Acredito que o façam, porque já deram o exemplo a propósito de um outro assunto que aqui também debati. Sei que o modelo competitivo, que esta Comissão Técnica de que falo engendrou, vai sofrer já no próximo ano os ajustes que o bom senso manda, com a colaboração (espero e presumo) daqueles que lidam com o mesmo e têm bons contributos a apresentar.

(Aliás, faço uma pausa no texto para referir que, apesar de agora também me dedicar a outros assuntos e de ter uma frequência lenta de publicação de posts – duas realidades -, ainda vai sendo neste Blogue que mais se escreve sobre Corfebol em Portugal, quer se queira quer não. Voltemos então ao texto…)

Portanto, junta-se a iniciativa da CT-FPC à nova Lei e havemos de encontrar um conjunto de regras que, de uma vez por todas, dê credibilidade à prática do treino de Corfebol. Não será qualquer um a desempenhar as funções que são reservadas ao Treinador. E isso é positivo!

248-B/2008
O grande desafio vem do tão esperado Regime Jurídico das Federações Desportivas (“e condições de atribuição do estatuto de utilidade pública desportiva"). Deixaram a este o título de “B”, talvez por alguma tecnicidade jurídica que me escape, como me escapam sempre essas tecnicidades.
A FPC, como todas as federações desportivas que pretendam manter o Estatuto de UPD, terá de adaptar os seus Estatutos à nova Lei. Para isso tem seis meses. Não são seis meses a partir do 31 de Dezembro, mas a partir de uma não agendada publicação de um despacho governamental, após audição do Conselho Superior do Desporto, em que vai estabelecer uma coisa tão complexa como a lista das modalidades que são colectivas e as que são individuais. Para quem ainda tem dúvidas sobre se o CSD (não o Colégio de Santa Doroteia, mas o Conselho Superior do Desporto) serve para mais do que alimentar e alimentar-se de tudo quanto é discussão sobre as mesquinhices do futebol, aqui está a prova contrária: Sem o CSD como é que o Ministro ia saber que modalidades é que são colectivas e quais são as amadoras?
Depois de mudar os Estatutos, terá de fazer eleições de forma a começar a época desportiva seguinte já com Órgãos Sociais coincidentes com as novas normas. Estando a FPC sem Presidente há algum tempo (mais do que aquele em que esteve sem Secretário e que originou uma queixa ao IDP… há coisas do caraças!), e estando eleições já marcadas para um dia destes, isto implica que vamos ter de fazer dois momentos eleitorais muito próximos, o que é sempre chato.

O desafio é grande. Independentemente de quando é que vão começar a contar os seis meses, meio ano passa num instantinho. Então quando implica discutir os temas sensíveis em que terá de se tocar… das duas, uma; ou o pessoal come e cala e mantém-se na inércia que leva a que se ande por aí a preconizar um futuro absurdo para a FPC – e aí o processo corre torto mas célere -, ou então há participação e discussão à séria e as coisas devem sair bonitinhas mas demoradas. Como gosto mais da segunda hipótese, é bom que as mãos estejam já metidas à obra.
E em que é que consiste o desafio, assim tão grande, ó Avô, para lhe dedicares um texto desta dimensão?... Pois responder-me-ei.

Temos logo à partida a questão da representatividade nas Assembleias Gerais. E vou saltar a parte em que se preconiza uma distinção descabida (porque é de Corfebol que estamos a falar e, que eu saiba, o DL nº 248-B/2008 também foi escrito para o Corfebol, embora não necessariamente a pensar no Corfebol) entre intervenientes nos quadros competitivos nacionais e regionais.
Mas temos a representação das associações de classe, com percentagem atribuída e tudo. Os Estatutos da FPC já contemplam a existência dessas associações. Um projecto de criação das associações nacionais de atletas, treinadores e árbitros de Corfebol chegou mesmo a ser iniciado pela Federação. Mas, como não era a Federação que tinha de demonstrar entusiasmo com isso e quem o deveria demonstrar nunca o fez… abortou-se a ideia. Agora, com votos na AG em jogo, talvez se ressuscite. Até porque o 248 assim o exige.
Nas AG já não se vão sentar os clubes. Serão delegados, eleitos pelos clubes e demais agentes que a isso tenham direito. Os delegados só podem ter um voto, que não pode ser feito por correspondência nem por procuração, e são no mínimo 30. Digo só o mínimo, porque o máximo nem interessa para o caso. Já alguém viu trinta mânfios numa AG da FPC?! Trinta!
Enfim, isso logo se verá. Para já, vai ser preciso definir como é que eles são eleitos (ou nomeados).
Depois, entre várias outras questões cuja resolução é de dificuldade variável, temos que os titulares dos órgãos federativos não podem acumular (desvende-se o que quer dizer “no seu âmbito” e talvez isto não seja tão restritivo como isso) com a posição de dirigente de clube, nem de árbitro, nem de treinador. Ora vejam lá se isto não vem dar uma machadada na habitual acumulação de funções da nossa pequena modalidade!

Uma coisa que pode assustar algumas federações menos preparadas como é (e sempre foi) a de Corfebol, é a tendência deste DL para plasmar em forma de lei as ameaças que tanto agradam ao IDP - a anulação do Estatuto de UPD é um fantasma que paira do princípio ao fim do diploma. Reavalia-se de quatro em quatro anos e assenta em critérios que estão (como sempre estiveram) longe de ser cumpridos pela FPC. Seria uma cobardia do Estado virar costas a quem tem de crescer e dar a mão apenas a quem dá frutos mediáticos. Mas o Estado, meus amigos, e o actual IDP em particular, não gozam de grande reputação democrática no que diz respeito à compreensão das limitações alheias. Vive-se num ambiente de análise fria de números e esses números servem para definir o tamanho da fatia de torta a que cada um tem direito pelos números que apresenta e não ao tamanho da fatia de torta que cada necessita para passar a apresentar outros números. E há muito técnico “desportivo” que nunca visitou uma prova desportiva desde que lhe deram uma cadeira na Infante Santo, cadeira essa onde engole números e vomita subsídios. E há muita vontade em cortar com apoios para quem não leva o nome desses “técnicos” aos jornais.

Não vou discorrer sobre o 248. Quem o quiser ler pode consultá-lo facilmente e quem terá de se debruçar sobre estes temas de certeza que já o leu de uma ponta à outra e já começou a engendrar a necessária revisão estatutária da FPC. Deixo só as notas soltas acima enumeradas, esperando que possa ser uma ajuda ao debate. Se o debate for construtivo, dou já os parabéns ao Corfebol português. Se prevalecerem outras motivações que por vezes inundam os comentários deste Blogue, então vão dar uma curva e encontramo-nos algures numa esquina apertada do Futuro.

sexta-feira, janeiro 09, 2009

Guerra de Primos V – Remate

5 Dias 5 Posts. É o meu contributo. Não fui à manifestação de ontem. Não tenho o poder mediático de outros cronistas. Mas dei um contributo quíntuplo. Pequenino vezes cinco, sopra-me a matemática, é mais que pequenino vezes um.
Como sempre, tentar não tomar partido seria hipócrita. Custa-me não ver o conflito do lado dos mais fracos, dos que mais sofrem, daqueles cujo território tem sido sucessivamente obliterado desde 1948.
Remato esta semana dedicada a um tema que durará mais do que esta semana. Uma guerra que começou muitas décadas antes e que terminará sabe-se lá quando. Seja ela contada em dias, seja em vidas, já vai longa demais, como longa vai a hipocrisia mundial.


quinta-feira, janeiro 08, 2009

Guerra de Primos IV – O Ridículo

Israel vai construir o Museu da Tolerância em Jerusalém. Cheguei a escrever “pretende”, mas substituí por “vai” porque os tribunais já o autorizaram, apesar da polémica. O Museu terá assinatura de Frank Gehry e visa "promover a tolerância entre os povos".
O probleminha que se coloca, talvez uma insignificância que nem merecia estar aqui plasmada, é que o mesmo será edificado em cima de um cemitério islâmico com interesse histórico inigualável. Os líderes religiosos islamitas ainda tentaram impedir judicialmente a construção, mas o Tribunal já sentenciou que a Tolerância vai mesmo atropelar o local sagrado.
Duvido que houvesse muçulmanos nessa tomada de decisão. Tenho a certeza de que, se se tratasse de um local de interesse histórico ou religioso para os judeus em qualquer parte do Mundo, se movimentariam influências para que o atentado à “tolerância entre os povos” não ocorresse.


É tão irónico que nem os Monty Python se lembrariam de uma anedota tão ridícula.

quarta-feira, janeiro 07, 2009

Guerra de Primos III – O Branqueamento

“A Vida é Bela” foi o único filme que me recordo de me ter feito rir e chorar na mesma sessão. Rir com a genialidade do Benigni actor e realizador. Chorar com a genialidade do Benigni actor e realizador. Mas chorar com um inexplicável sentimento paternal e chorar com o clamor da realidade, com a crueza de olhar para acontecimentos que foram pano de fundo num contexto concreto, palpável, vivido por milhões de pessoas.
O Holocausto existiu. Existiu e deve ser lembrado, todos os dias. Ridículos são aqueles que o negam. Xiitas e outros fascistas.
A minha simpatia triste e resoluta vai para todos aqueles que sofreram com a perseguição nazi aos judeus. Curvo-me perante os resistentes, junto o meu choro ao das famílias dos mortos.
Mas não posso aceitar que o sofrimento passado possa justificar actos que promovem o sofrimento de outros.

Hoje o divórcio é uma coisa banal, que acontece na porta ao lado sem que se dê por isso. Na minha juventude era menos comum e criou-se uma raça a que se chamava “os filhos de pais separados”. E isto dizia-se veladamente, com um olhar de compreensão e comedimento.
Aos “filhos de pais separados” permitia-se tudo, coitados!, porque tinham de carregar com esse trauma. Deixava-se que fossem insolentes, mal-educados, mal comportados, egoístas, porque eram “filhos de pais separados”. E assim, porque sofriam, tinham direito a ter atitudes que estavam vedadas aos sortudos que não eram “filhos de pais separados”.
Tenho a certeza de que sofriam. Tenho a certeza de que hoje sofrem aqueles a quem a vida não permitiu manter estabilidade emocional doméstica. Não me verão negar essa evidência. Mas isso não justifica que não se lhes possa levantar um dedo sem que alguém diga logo “Vê lá, não fales assim, coitado, ele é filho de pais separados”.

Pois também não é politicamente correcto apontar o dedo a Israel, porque isso é não respeitar a memória dos judeus perseguidos pelo nazismo.
Balelas!
Não respeitar essa memória é negar a si mesmos os ensinamentos que deveriam ter sido prestados com o Holocausto e os vários holocaustos a que o Mundo tem assistido ao longo dos anos. Quem recolhe simpatia pelo que passou e se vinga em terceiros com a mesma moeda que lhe foi arremessada, deixa de merecer essa simpatia.

Mas a simpatia continuará sempre. Porque o povo judaico foi moldado de uma forma que o faz ter sucesso financeiro. Dessa característica vieram-lhe os maiores males (pela ambição e inveja de vizinhos) e os maiores bens (pela influência que conquistaram na sua diáspora).
Nos todo-poderosos EUA não há passo importante que se dê sem o aval dos líderes judaicos. No Mundo não há passo importante que se dê sem o aval dos americanos.
Portanto não espanta que Israel tenha, ao longo da sua curta história, atropelado várias resoluções da ONU, sempre com a conivência dos States. Não espanta que, por muitas manifestações populares a que o Mundo assista, nenhuma atitude firme seja tomada contra os atentados a que a população dos territórios ocupados tem sido sujeita ao longo dos anos.
Não quero deixar de condenar os atentados a que são sujeitos, mas é inegável que há um branqueamento dos crimes humanitários israelitas.
Bombardear mesquitas à hora da oração é crime. Mesmo que se diga que é nas mesquitas que se escondem os terroristas e as suas armas, será que é só à hora da oração que eles lá estão? E será que essas armas estão mesmo lá, ou são só os sapatos que eles deixam à porta (uma arma aclamada pelos muçulmanos)?
Impedir a saída de refugiados e a ajuda humanitária é crime. Ou será que têm medo que os terroristas se escondam no meio dos refugiados? Ou que os caixotes de auxílio humanitário tenham bombas? Não há desculpa.

terça-feira, janeiro 06, 2009

Guerra de Primos II - Pedras contra Artilharia

A história do David e do Golias é só na Bíblia e na Trofa. Na Palestina o David não derrota a golpe de funda os tanques e as bombas de um dos mais bem equipados exércitos do mundo. Se calhar é porque o nome David está trocado nesta história.

O desenho começou logo a fazer-se no feminino. A branca e rica Sara derrotou a escrava egípcia naquela que terá sido a primeira batalha israelo-palestiniana.
Hoje é a Intifada das pedras contra o poderio militar titânico dos israelitas. Os rockets que ladram mas mordem pouco contra bombardeamentos sucessivos que matam centenas em poucos dias.
Sem querer legitimar o terrorista Hamas, tão criminoso como qualquer outro movimento terrorista, apelo ao sentido de proporcionalidade. Haja bom senso quando avaliamos a dimensão das retaliações. Por cada soldado israelita feito prisioneiro, um batalhão de guerrilheiros (irónico ouvir-se chamar-lhes isto no seu próprio país…) palestinianos será aniquilado. Por cada civil morto por um rocket, duas mesquitas apinhadas serão bombardeadas.

Cada pedra arremessada tem mais carga emocional que uma rajada de metralha. Assim o foi em Belfast, assim o foi no Soweto, assim o é na Faixa de Gaza.

Entretanto, com a estupidez inflamada de uns e a estupidez arrogante dos outros, morrem os filhos de uns e outros.

segunda-feira, janeiro 05, 2009

Guerra de Primos I - A Culpa é da Sara

Abrão, mais tarde nomeado Abraão (chamemos-lhe Abraão, que é menos sujeito a trocadilhos), estava casado com Sarai, também conhecida como Sara (chamemos-lhe Sara, que é bem mais giro). Sara era infértil e Abraão queria descendência.
Naquela altura não havia clínicas de fertilidade e os costumes eram estranhos por demais. Mesmo conjugando estas duas realidades, custa-nos a nós, modernos habitantes desta Terra que Deus pôs em seis dias, compreender a história que se segue.

Para que Abraão tivesse filhos, Sara proporcionou-lhe os favores sexuais de uma escrava egípcia chamada Asgar, ou Agar, ou Hagar (chamemos-lhe Hagar, que parece o menos mau). Dessa união extraconjugal (apesar de arranjada intraconjugalmente) nasceu Ismael.
Entretanto, Sara precisou de passar dos 90 (!) anos para verificar que afinal não era infértil, ou então que a fertilidade goza com a libido e regressa na 3ª idade para tresloucar as damas. Não encontro registo da idade do Abraão, mas o que é certo é que lá teve, finalmente, uma criança com a legítima esposa. Deram-lhe o nome de Isaque, ou Isaac (chamemos-lhe Isaac, que é mais cool).
Tricas de telenovela se seguiram, com ciumeiras dignas do horário nobre da TVI, por causa do amor que o patriarca dedicaria a cada um dos filhos e cada uma das mulheres. Acabou por ganhar a velhinha Sara, que fez com que o marido expulsasse a escrava e o ilegítimo.
Ismael procriou como um coelho e espalhou pelas Santas Terras a semente dos Ismaelitas.
Isaac teve dois filhos. Um deles, Jacó, ou Jacob, mais tarde chamado Israel (chamemos-lhe Israel, que se encaixa melhor nesta história), com umas novelescas fricções fraternas pelo meio, acabou por disseminar a tribo dos Israelitas.

Entretanto, Deus, sempre omnipresente nestas atribulações, tinha prometido uma terra fértil (talvez numa sátira à desventura de Sara) a Abraão e à sua descendência. Era ali a caminho de Mais ou Menos, perto de Onde Todos Sabemos e Ninguém tem a Certeza.
Como em qualquer caso de partilhas, abriu-se a contenda com a morte do velho. Os irmãos e respectiva descendência lutaram ferozmente, e ferozmente lutam ainda, pelo direito à Terra Prometida. Entre o filho mais velho e o filho legítimo a pancada é atroz. Os tribunais, terrenos ou divinos, tardam a achar a razão. Os primos, descendência de um mesmo avô, guerrear-se-ão até que o seu Deus comum (porque, sim, é pelo mesmo Deus que lutam) resolva desatar o nó que tanto enredilhou.

segunda-feira, dezembro 29, 2008

Tempo de Balanço

Estamos a meio de uma época inovadora. Estabeleceu-se um modelo novo, polémico. Polémico e novo são quase sinónimos. Sempre que se muda, polemiza-se.

Sobre o modelo, e o que lhe vi de bom e mau, ficou um e-mail escrito, enviado, recebido, metido na gaveta e apagado do mapa arrogante e incompetente onde acabou por aterrar – aterrar o e-mail e o seu contexto –, o corfebolinho mesquinho e suas vendettas inconsequentes, a necessidade de sujar toda uma camisola para não se notar a nódoa que lá estamos a deixar crescer.
Mas isso agora não interessa nada e, para mais, a prática obriga ao refresh de ideias.

O refresh que eu faço, que todos podemos fazer, que os clubes farão de certeza, que a CT da FPC terá de fazer, implicará uma reavaliação da realidade.
Acho que deve haver estabilidade nos modelos adoptados. Não podemos transformar-nos no sistema nacional de ensino, onde os modelos de ensino ou as avaliações de alunos e professores variam ao sabor de mudanças de governos, ou pior, de ministros, ou pior ainda, dos humores de ministros.
Mas também acho que não se podem fechar os olhos às evidências e às opiniões de quem lida com os modelos impostos. Esta é uma boa altura para se debaterem vícios e virtudes do modelo apresentado e corrigi-lo, ajustá-lo, e até, eventualmente, revogá-lo, se as resistências forem mais fortes e pertinentes que a vantagem da estabilidade.

O que não pode é acontecer como antes de 2007/08, em que tudo estava pronto para arrancar em atropelo completo ao estabelecido no ano anterior. A justiça desportiva exige que as consequências dos resultados sejam conhecidas antes da disputa desses resultados. Por uma questão de planeamento (traçar de objectivos) de quem participa e por uma questão de credibilidade (decisões apenas em abstracto) de quem decide.
Nem deve acontecer como antes de 2008/09, em que, com um ano (depois do revés anterior) para apresentar o modelo, se acabou por o impor de novo em cima do acontecimento, escudado por uma cláusula duvidosa de “depois logo se vê”. Já não se atropelou o estabelecido; agora nem sequer se estabeleceu, que é para precaver atropelos. Esperteza saloia!

Um modelo com grupos mutáveis em vez de divisões é, logo à partida, um revés em termos de imagem. Para o exterior, haver 1ª e 2ª (ou até 3ª, como já houve) divisões é um ponto a favor quando queremos vender a modalidade lá fora. O sistema actual torna complicado explicarmos aos nossos amigos a que nível jogamos e mandar resultados para a comunicação social.

Por outro lado, este abolir de fronteiras favorece a mobilidade dentro de uma mesma época desportiva, o que vejo com muito bons olhos desde que eles – os olhos – se puseram pela primeira vez em cima da proposta (chamemos-lhe assim, apesar de nunca o ter sido). Sendo o Corfebol em Portugal uma modalidade muito volátil, este aspecto é muito interessante.
Factores de pormenor fazem com que o valor das equipas varie muito de uma época para outra. É positivo, portanto, que cada uma possa encontrar o seu espaço durante a época, podendo subir ou descer de acordo com os resultados conquistados.
E há a possibilidade sempre latente de uma equipa nova ambicionar mais do que uma subida por ano. Uma equipa nova pode, com este modelo, começar em baixo e conquistar o título nacional logo no primeiro ano de existência. É claro que este raciocínio, hoje, remete para o Sporting, mas podia ser qualquer outro clube, como qualquer outro pode surgir em anos que aí venham e terá (se o modelo se mantiver) igual possibilidade.

Esta situação de mobilidade faz com que os jogos sejam tendencialmente equilibrados, o que é bom. Quando as equipas sobem e descem de acordo com o seu valor, vão ajustando as suas posições ao valor que têm. Ou seja, os grupos tendem a ser compostos por equipas de nível competitivo idêntico.

O reverso da medalha é que acaba por se jogar sempre com os mesmos, durante um ano inteiro. Quando se reduziu o número de jogos nos play offs, foi acima de tudo porque as equipas faziam demasiados jogos contra os mesmos, apanhando sempre as mesmas caras pela frente. Havia jogadores que já sabiam os tiques todos daquele oponente directo que lhe calhava sempre na rifa, porque era o mais alto, ou o mais rápido, durante vários jogos seguidos, até ao enjoo.
Pois hoje, fase após fase, aquelas equipas que não sobem nem descem (que são, por lógica matemática, a maioria), passam a época a jogar com os mesmos adversários.

E dessas, algumas jogam durante três quartos do campeonato, literalmente a feijões.
Por causa da mudança regular da constituição dos grupos, não é possível fazer transitar pontos de uma fase para a outra. Olhemos, então, para as consequências desse facto nas equipas que, cronicamente, não sobem nem descem. Principalmente nas das extremidades – as primeiras do grupo A e as últimas do grupo D.
O CCO ganhou os jogos todos até agora. Isso serve de alguma coisa? Nada. Garantiu a presença no grupo principal, mas isso nunca se pôs em causa, como não se põe para o NCB e para o CCCD. Os resultados entre estas 3 equipas contaram para quê? Nada. Antes pelo contrário, visto que alguma lógica que me escapa coloca a melhor equipa do grupo A a jogar com a melhor do B, no wild game, o que é radicalmente injusto para ambas. De resto… as hipóteses de ser campeão são iguais para qualquer um dos participantes que fiquem no primeiro grupo até à última fase. Portanto, anda-se a jogar a feijões entre as 3 primeiras. Quando os jogos forem a doer, já passaram meses de motivação escassa.
Lá para baixo é igual. As equipas C do NCB e do LAC andam há meia temporada a jogar entre si, sem pensar em subir mas sabendo que, de ciclo em ciclo, de fase em fase, é feito um reset aos resultados. Só lá mais para a frente é que ganhar vale alguma coisa de concreto.

Não é fácil agradar a gregos e a troianos. Não é fácil encontrar os melhores modelos. Não é fácil prever consequências. Devo dizer que o último aspecto a que aludi me escapou na análise prévia que tina feito. Só a prática me abriu os olhos para isso.
O que não é difícil, agora, acho eu, é promover o debate e respeitar opiniões. Não é difícil, acho eu, dar contributos e recebê-los.
Convém é ir fazendo isso enquanto há tempo para debater. Talvez num ENT ou num END, se ainda se souber o que isso é.

segunda-feira, dezembro 08, 2008

Carros e Lixo

Hoje não há carros do lixo em Lisboa. Quer dizer, há alguns, mas não sei quantos. Os sindicatos e os patrões conseguem sempre apresentar números tão díspares (o mesmo com os professores, o mesmo com os correios...) que nem vale a pena tentar saber os correctos valores de adesão.
Carros - Lixo - Lisboa... Não tem relação com a greve, mas leva-me a escrever o seguinte texto:
Faz poucas semanas que Lisboa parou por causa de 15 minutos de chuva. Parou, literalmente. Túneis inundados, lojas alagadas. Numa Capital que se diz Europeia. Valeu ser fim-de-semana.

Na mesma altura, tinha o pára-brisas dianteiro do meu carro manchado a branco com um papel publicitário de uma qualquer loja de móveis da Reboleira. Não sei de que raio de cola era feito o papel, mas demorou longos dias a sair. Nem à força da tromba do elefante azul, nem à força da chuva. Foi o tempo que acabou por fazer sair, aos poucos, o danado do panfleto.
Mais carros das imediações tinham vestígios da loja de móveis na Reboleira. O que era suposto ser um simples panfleto passou a praga na vizinhança. Não era suposto colar, digo eu, mas colou. E bem.
Mesmo que não colasse, esse papel e todos os outros que se metem nos carros são pragas.

Sou daquelas pessoas que guardam um papelinho de rebuçado no bolso até encontrar um caixote do lixo. Isto não me soa a grande qualidade – o lógico seria todos fazerem o mesmo – mas sei que até acaba por ser. Há tanta gente que deita papéis para o chão, de uma forma revoltantemente indiferente, que acaba por ser meritório fazer algo que o bom senso consideraria banal. O bom senso ou a civilidade que se verifica noutras zonas do Globo.

Portanto, sou também daqueles que, sempre que apanham um papel do limpa pára-brisas – ou da porta, como agora é hábito fazer-se – do carro, o guardam e esperam por uma oportunidade para o deitarem fora. Mas não somos muitos, ao que parece.
Daí a praga. A culpa é de quem atira o papel para o chão, mas não deixa de ser para quem o meteu no carro.
Até porque, às vezes, por exemplo com chuva, o papel fica de tal forma que não apetece muito guardá-lo. E há aquelas vezes em que não nos lembramos de o apanhar e acaba por voar a meio do trajecto.
Enfim, nada disso aconteceria se não o tivessem lá posto.

E para onde é que vão os milhares de panfletos que são amachucados e mandados ao chão?
O vento e a água levam-nos por aí, conspurcando os caminhos, e acabam por morrer nas sarjetas, onde formam um bolo compacto. É esse bolo que impede o escoamento de chuvadas de 15 minutos.
E um quarto de hora de dilúvio pára Lisboa.

Sim, o pessoal das Câmaras também tem culpa, por não limpar as sarjetas antes das chuvadas. Sim, é o típico “depois da casa roubada, trancas à porta”.
Mas o comum cidadão tem uma responsabilidade de que não se pode safar tão facilmente no dia do Dilúvio Final.

Os panfletos nos carros são só um exemplo, a que decidi dar mais destaque por estar ainda revoltada com a alva mancha que a loja de móveis da Reboleira me deixou no carro.
Mas há mais…

Maços de cigarros que voam pelos vidros dos carros fora. Pessoas que andam com o maço no bolso enquanto tem cigarros, não conseguem guardá-lo mais um bocadinho até chegarem ao seu destino, onde decerto haverá uma cesta de papéis?
Terão consciência do tempo que a voraz Natureza demora a fazer desaparecer aquele misto de papel, prata e plástico?

E os cigarros propriamente ditos?
Paragens de autocarro, apesar de todas terem uma papeleira dotada com aquela engenhosa chapinha para apagar cigarros, estão atapetadas por cigarros mais ou menos consumido, dependendo do tempo que a carreira demorou a chegar.
E os condutores vão deitando o cigarrinho pelo vidro porque ficar lá dentro deixa mau cheiro. Fumar não deixa cheiro, mas usar o cinzeiro sim, que nojo, nem pensar!
E alguns que até usam o cinzeiro, despejam-no de encontro ao lancil, fazendo poças de beatas junto aos passeios.

O vento e as águas as levarão. Para a sarjeta. Para entupirem o escoamento das chuvadas. Para provocarem de novo que a Capital se imobilize aos próximos quinze minutos de aguaceiros.

Gente estúpida!

quarta-feira, novembro 12, 2008

Quatro

Quatro. Quatro anos. Quatro anos de Blog.
147 (mais este) textos. Pouco mais de 3 por mês. Cada um deles a motivar uma média de 5,3 reacções escritas.

Quatro anos na vida de um Avô são peanuts. Mas peanuts saborosos. Peanuts agradáveis, como os do Schulz. Peanuts deliciosos, como aqueles com mel.
Quatro anos na vida do Corfebol são migalhas. Mas migalhas com história, parte da história, que escrevem história. Migalhas que marcam vidas, que marcam tempos, que deixam marcas.

As voltas que o Mundo Corf deu em quatro anos…! Fico feliz por ter podido cravar na madeira as impressões de algumas dessas voltas. Impressões pessoais, sempre pessoais, sempre implorando para serem lidas como tal. Sem vergonha de o serem – antes e sempre pelo contrário! – mas entristecidas por lhes ser por vezes exigido um unanimismo que só poderá ser explicável por estarem sós.
E sós continuam, apesar de uma efémera ameaça de réplica rejuvenescida. Sós. Simplesmente sós. Não orgulhosamente sós. Ansiando por companhia, por contraponto, por uma dinâmica que tarda em fazer-se ver.

Quatro. Quatro anos. Quatro anos de Blog do Avô.
Parabéns para mim, nesta data querida, muitas felicidades, muitos posts pela vida fora…

quarta-feira, outubro 29, 2008

"Gostei da Uzi"

Morreu um puto. 8 anos.

Por acaso foi só ele, mas o descuido podia ter furado a balas outras pessoas que estivessem por perto.
Estava a participar num festival. Uma feira. Uma exposição. Uma demonstração. Com entrada livre para menores de 16 anos. Boa!
Festival de quê?... Ora, com criancinhas… Talvez o Noddy sobre o Gelo. É o que está a dar. Ou do Bob, ou das Winx…
Não; tinha um cariz mais informativo, tipo demonstração de produtos com experimentação. As criancinhas podiam mexer nos artigos expostos.
Talvez uma feira científica. Ainda no outro dia fui a um dia aberto na Fundação Gulbenkian em Oeiras e foi muito giro. Os miúdos andavam mais atrás das gomas que lhes ofereciam do que propriamente a querer aprender, mas aprendiam sempre, e os adultos que os acompanhavam também. São boas as feiras de ciência, onde se pode aprender, mexendo e observando.
Mas também não. Era nos states. E o Noddy, até prova em contrário, não mata criancinhas. E a ciência, se matar, não é a furo de bala.
Foi um festival de armamento. Sim, com armas a sério, crianças a sério, tiros a valer. Quem se iria lembrar que, com esta mistura, alguma criança, devidamente supervisionada por um instrutor licenciado, ainda dava um tiro em si mesma?
É surreal. É americano!
Se um árabe sacasse de um canivete num 7-Eleven pejado de americanos, era logo conduzido a Guantánamo a pontapé e punham-lhe eléctrodos nas orelhas (para dar uma visão suave). Mas os proud americans incentivam a violência, deseducam os jovens, promovem acidentes estupidamente fatais… e saem alegremente, cantando e rindo, para o próximo festival. E são as próprias autoridades que organizam estas imbecilidades.
Depois admiram-se de elegerem cowboys mascadores de tabaco, com winchester a tiracolo, para presidir a esse great country.

A notícia audiovisual do Público donde retirei esta informação, conta ainda uma história que é paradigmática. Alerto desde já os mais cépticos de que, apesar de parecer uma paródia digna de qualquer comediante, os diálogos que se seguem são reais. Estúpidos, mas reais.
Pois então, um pai vai passear com o filho. É bonito; aproveitar um fim de semana solarengo para passear com o rebento.
Onde é que vão? Ao jardim? Jogar soccer? Ao Zoo? À pesca?...
Não. “Hoje vamos disparar algumas metralhadoras”, diz, orgulhoso, o petiz, filmado pelo orgulhoso papá.
Claro; como é que não me lembrei disso antes? Pai que é pai, leva os filhos a disparar metralhadoras de vez em quando. É ternurento, cria laços, educa, forma homens com A (de american) grande.
E o home movie continua. É contagiante a felicidade estampada na cara da criança, enquanto compra os acessórios de mortandade de que necessita para o passeio.
No local, qual feira gastronómica, o miúdo quer experimentar de tudo e fá-lo com a satisfação da descoberta, brilham-lhe os olhos com o poder que tem nas mãos.
“O que achaste da Uzi?”, pergunta-lhe o pai. “Gostei da Uzi”, diz o filho.
Talvez à saída o pai lhe tenha comprado uma Uzi. Dá sempre jeito lá em casa, ao lado da Sig550. E pode ser que, agora que tem uma Uzi no louceiro, o pai até ofereça a velha Beretta ao jovem, que tão bem se portou.

A actual campanha eleitoral nos states fez florescer em mim, qual trepadeira insaciável, um ódio de estimação àquela amostra de mulher que é candidata a Vice pelo partido do Elefante.
Falando em armas, e da forma como estas são encaradas num país em que um menor tem mais facilidade em comprar uma espingarda do que em beber uma cerveja, tenho de voltar outra vez os meus chispantes olhos para a mentecapta alasquiana. Por ela, e por todo o lobby do armamento, podem morrer crianças enquanto brincam com armas, podem morrer crianças enquanto os amigos brincam com armas, podem morrer crianças enquanto os pais limpam as armas.
Este assunto é mais uma lata de tinta no grande mural que o Mundo inteiro (e, desta vez, até os próprios states) tem vindo a pintar, e que diz qualquer coisa como “Mandem essa gente embora!”, o que, traduzido em linguagem de actualidade, seria “Vota Obama!”.

E, já que foi o Público que aqui me trouxe, ficam duas do grande Luís Afonso sobre a tacanha Pallin:




quarta-feira, outubro 15, 2008

A Selva do Estacionamento


Não me irritam as regras que visem disciplinar o trânsito. Há quem, pura e simplesmente, se revolta contra os parquímetros, os funcionários da EMEL e afins, as rodas bloqueadas, as fitinhas amarelas à volta dos carros, os reboques… Mas isso não são mais do que formas de fazer cumprir as leis. E, normalmente, não é contra as leis que as pessoas estão, mas contra a sua aplicação.
A mim, o que me irrita a sério é a incongruência que faz com que as leis, em vez de disciplinadoras, passem a ser motivo para que haja mais indisciplina.
Pois no estacionamento é assim. Bloqueiam-se os carros que estejam numa zona autorizada mas sem pagamento válido. Já quem está em cima de passeios, passadeiras, paragens de autocarro, curvas… não é sequer incomodado porque há mais funcionários das empresas de estacionamento do que polícias de trânsito.
Então, a chicoespertice lusitana faz com que, todas as manhãs, nas zonas de trabalho, todos os fins de tarde, nas zonas residenciais, se veja uma corrida ao lugar. Não ao lugar válido, delimitado, legal, mas ao lugar de recurso, que transtorna o trânsito, o pedestrianismo e as eventualidades de emergência… mas que é à borla.
E é ver locais de estacionamento vazios, rodeados de viaturas estacionadas à papo-seco em tudo o que é canto. Isto aplica-se tanto à Lisboa matinal como aos concelhos limítrofes nos finais de tarde.
Que os que aterram nos passeios me perdoem, mas acho que deviam ser rebocados antes dos que puseram moedas e perderam mais tempo nas Finanças do que estavam à espera e deixaram escapar a hora do parquímetro.

E pronto; fica aqui um desabafo de Cidadão.

sexta-feira, outubro 03, 2008

God vs. The Crab

Não se trata de um combate de Wrestling - Dois colossos encenando pancadaria. Não se trata de um comic da Marvel - O humano transformado em herói imbatível, frente ao ultra-vilão em forma de caranguejo antropomórfico. Não se trata de um episódio bíblico - Deus contra a besta.
É uma luta, sim, mas real. Do mais mundano possível, pois que bem mundanas são as modernas provações da saúde.

E é o “Pai” do Corfebol em Portugal que empreende hoje a luta contra esse terrível inimigo, invisível e interno.
Na surdina dos corredores corfebolísticos, o discreto e o indiscreto confundem-se e as novas vão-se sucedendo, entre boas e más, raramente concretas. Sabemos, acima de tudo, que é uma luta árdua, complicada.
De repente, quase sem querer, tropeço numa outra via de informação e leio os diários de batalha. Sensíveis mas incisivos. Bem humorados mas sem quererem esconder que o que os motiva é um problema grave.
O Mário tem uma veia artística que me agrada há muito tempo. Em tempos idos, descobri o coração que ilustra este texto (acho que não era este; era um muito parecido) num sítio qualquer improvável (um Centro Comercial?... não me lembro) e fixou-se-me o agrado na memória. Mas também as fotos e, agora, mesmo que tudo lido na diagonal, o diário público de um combatente privado (mais do que privado – interno).
Tenho uma admiração maior pela obra do que pelo cultivo de relacionamentos. Em muitos anos de diversos tipos de convivência, não é alguém em quem veja motivos para chamar Amigo, com a maiúscula que outros me merecem. Talvez porque eu também não o tenha feito por merecer, mas isso agora também não vem ao caso. Só acho bom que não fique no ar um cheiro da hipócrita conversa que aflora normalmente nos maus momentos e em que os tiros que ontem demos são hoje flores.

E assim, despido de hipocrisias e discursos politicamente correctos, sinto-me à vontade para desejar, com toda a sinceridade, uma curta mas eficaz passagem pelo “castelo das curas”.

quarta-feira, setembro 24, 2008

Eles andam aí...


Eles andam aí... de novo. É cíclico. É mais certo que as andorinhas migrarem, mais certo que as galinhas porem ovos, tão certo quanto o Sol se pôr todos os fins de dia.
Caras feitas em paleta de mau artista, adereços tão inusitados como penicos na cabeça ou fraldas em cima de calças, orelhas de burro, cartazes ao pescoço com insinuações insultuosas para os seus portadores, eles andam por aí... berrando cânticos sobre orgias e orgasmos, louvando a instituição que os acolhe oprimindo-os... arrastando-se em comboios de grilhetas improvisadas... humilhando-se... expondo-se... dirão alguns que integrando-se.
Eles andam aí... vigiados por abutres toldados de negro, que usufruem de uma autoridade que visivelmente não gozam durante o resto do ano... abutres negros rebaixam divertindo-se, que se divertem vingando-se, que se vingam humilhando, que humilham integrando, que integram rebaixando.
Eles andam mesmo aí... a Cidade encheu-se deles... de novo... abrindo as portas ao nível dito “superior” da mais nobre das missões humanas... a do “ensino”.
Eles passeiam por todo o lado, estampados com o carimbo de quem atingiu a felicidade de entrar para a cada vez menos restrita fábrica de dêérres... estampada a felicidade de uma forma paradoxalmente triste... eles passeiam por aí... sem saberem se devem dar urras por viverem momentos memoráveis ou se devem desejar que estes momentos acabem depressa...
... para que também eles possam espezinhar os dejectos andantes que ousem ser caloiros nas suas escolas.




quinta-feira, setembro 11, 2008

Duas Portas Abertas

Não há fome que não dê em fartura, nem que as farturas estejam no lado oposto da 2ª Circular.
3 anos e meio depois de escrever sobre a fresta por onde se podia espreitar um Corfebol de águia ao peito, eis que os leões saltam primeiro para esta mista arena que nos acolhe.

O mais giro é que duas portas se abriram em simultâneo lá para os lados daquela gigantesca casa de banho. Sem confluência de esforços, o que se lamenta numa modalidade tão pequena, valeu a “Cunha” maior e já está aí, a
pleno gás, o primeiro núcleo de Corfebol com o nome de um dito “grande”.
Se tivesse falhado esta hipótese, havia a outra, um projecto mais antigo, com outras características, mas que também garantiria camisolas de Corfebol às riscas verdes e brancas.

Olhando para o texto sobre o Benfica, quase que apetece fazer copy-paste. Corfebol no Sporting dá credibilidade e mediatismo à modalidade, E, abertas as portas, a tarefa de quem a agarrar é fácil, pelas mesmíssimas razões então apresentadas.

Para já, parece que vai no bom caminho. Quem está à frente do projecto já provou que não precisa de lições sobre como captar atletas. E até na comunicação parece haver uma aposta ganha, com um bom site e boa apresentação geral.

Claro que, quanto ao mediatismo, é pena que, via SCP, o Corfebol possa chegar aos ouvidos de mais pessoas e essas, se quiserem saber mais sobre nós, se depararão com um site federativo que passou de parado para desligado.
...Não se pode ter tudo.

sexta-feira, setembro 05, 2008

A Beata do Alasca

Falemos dos americanos.
É típico daqueles que agem como donos do mundo não serem propriamente exemplares nos critérios que utilizam para escolher os seus líderes.
Eleições que, à imagem do desporto-espectáculo, valem pela vitória absoluta e não pelos números relativos (ganhar dois estados por 1 voto vale mais que ganhar um estado por mil), campanhas que ostentam bandeirinhas e confettis em vez de ideias, soundbites escolhidos por legiões de profissionais especialistas na manipulação, lobbying institucionalizado… enfim, escolhas duvidosas só podiam dar em políticas duvidosas. O que nem seria preocupante, não fora sabermos que os reflexos no nosso rectangulozinho à beira-mar plantado são enormes, como enormes são em todo o globo terrestre and beyond.
O senhor republicano de sorriso de plástico (mais que pepsodent, aquilo é corega plus) escolheu uma senhora para o acompanhar na corrida presidencial. Só será surpresa para quem só tenha acordado hoje que nenhum comentador analise esta escolha de um ponto de vista de governação - quais as mais-valias de ter a senhora Palin na vice-presidência? - mas sim de um ponto de vista eleitoral - as mulheres democratas, desiludidas com a derrota da Hillary, vão aderir a uma candidatura feminina? os ultra-conservadores vão aderir a uma candidatura do mais reaccionário que há? e por aí adiante…
Também não espanta que este debate, já de si inócuo, passe para segundo plano quando chegam as notícias, mais ou menos picantes, de cariz pessoal e familiar. Esqueça-se que a senhora defende a venda indiscriminada de armas; esqueça-se do que advoga em termos de direitos sociais; esqueça-se que baralha evolucionismo com criacionismo; esqueça-se que defende que o homem não influi nas questões climáticas… Temos coisas mais giras para falar! Falemos do marido que foi preso há vinte anos por conduzir alcoolizado; da filha, adolescente e solteira, que está grávida; de um suposto e sempre desmentido affair que terá tido com um colega do marido; das ligações do marido aos independentistas do Alasca. Sim, falemos da família e não dela, porque é mais divertido. Falar de política é chato, mesmo quando se trata de eleger a equipa presidencial do Estado mais poderoso do mundo.
Estamos a falar de um país onde um candidato tem de abandonar a sua candidatura quando se descobre que, durante o serviço militar, teve medo de saltar de um helicóptero. E se nem sequer cumpriu serviço militar, então nem vale a pena lá aparecer. Estamos a falar de um país onde um dos presidentes mais consensuais (pela positiva, tanto interna como externamente) de uma longa história teve de se demitir porque veio a público que uma estagiária lhe brincava com as partes íntimas.
Estamos a falar de um hipócrita país onde a família é arrastada para a esfera pública como se isso contribuísse alguma coisa para a gestão pública. Não pode haver comício sem que esposas, esposos e filhos (neste caso, até o futuro genro, para mostrar que a miúda está grávida mas que tudo vai voltar “às direitas”) estejam no palanque, a acenar, a sorrir, a dizer que a mamã (ou o papá, ou o maridão, ou a mulherzinha, ou até a sogra) é a maior, e que vai ganhar, e que estamos todos muito “proud of her” e que “God bless America”.
Mas estamos também a falar de uma candidata que é a 2ª mulher a concorrer à vice-presidência, presumo que a 1ª republicana. Estamos a falar de uma eleição que esteve a um passo de ter a primeira mulher a concorrer à presidência. Uma eleição que tem um não-branco a disputar esse lugar pela 1ª vez. Mas isto não interessa. Queremos é sangue, de preferência da família, de preferência com sexo à mistura.
E assim, no meio destes disparates, como é que querem que me sinta seguro? Eu devia poder votar no “Leader of the Free World”. Eu e todo o “Free World”. Nós e também os habitantes do outro “World”, onde quer que isso seja, porque esses ainda levam mais com as decisões do “Leader” do que nós.
Todos. Todos devíamos votar nas eleições americanas. Todos os habitantes deste 3º Calhau a contar do Sol.
Mas não votamos. Se eu votasse, entre o péssimo e o aceitável, votaria no Obama… Mas só se não me deixassem votar na Mackenzie Allen.

terça-feira, agosto 26, 2008

Notas da Olímpia do Meio


É ao cair do pano sobre a peça que se deve sobre ela elaborar uma crítica de teatro.
Assim o farei sobre a presença lusa nos Olímpicos deste ano. Apenas após o final.

O Sr. Presidente
Não o fez o Presidente do COP. Vicente Moura resolveu fazer um balanço precoce sobre a participação da comitiva portuguesa, denotando um desrespeito indesculpável pelos atletas (que ainda eram bastantes, mas nem que fosse um só) que ainda não tinham feito a sua saída de cena.
Com isso, e porque o Nelson Évora até nos deu a suprema alegria, entrou-se no “Vicente vai, Vicente fica”, que lhe retira credibilidade e ditará, quase aposto, a ausência de uma recandidatura do Comandante.
Credibilidade que já tinha pouca depois de saltar para a opinião pública o contrato que fez com o Governo, trocando verbas por medalhas e pontos. Considero absurda promessa de resultados desportivos neste tipo de contratualização e, pelos vistos, foi um absurdo baseado em perspectivas irreais. É que, mesmo tendo obtido um resultado global bem acima da média, Portugal ficou a menos de metade das medalhas (2 para 4/5) e dos pontos (28 para 60) prometidos.
José Vicente Moura é, para mim, o grande derrotado nacional destes Jogos.

As Expectativas
Um dos grandes problemas de toda a confusão que se instalou quanto ao exigir de resultados, foi o identificar de patamares racionais de expectativas.
A maioria dos portugueses só identificou favoritos e candidatos quando a comunicação social no-los meteu à frente. Engolimos tudo como nos disseram, porque não fazemos a mais pálida ideia do que os nossos representantes valem. Como é que havíamos de fazer? Alguém viu alguma prova destes atletas (salvo raras excepções) durante os últimos quatro anos? É mais fácil esperar que os jornalistas nos digam quem é que vai competir para o Ouro, para as finais, para as meias-finais, ou só para participar. O problema é que essa análise teve falhas.
Primeiro, porque há uma necessidade tuguesinha de termos heróis. Se fulano ganhou um mundial em 2006, é o melhor do mundo, mesmo que tenha havido mundiais em 2007 e 2008 com outros campeões. Não sabemos o real valor de cada prova; o que interessa é realçar os êxitos dos nossos atletas, mesmo que esses sucessos não representem tanto como aparentam. É como ganhar uma 1ª Divisão e sermos heróis, esquecendo o povo ignorante que há uma Divisão de Elite, onde estão os melhores (por exemplo).
Com a Vanessa Fernandes passou-se algo de género. Andou por aí a limpar provas da Taça do Mundo, foi Campeão do Mundo, é uma heroína nacional. Digo “é”, porque será sempre. Mas andámos a ser enganados este tempo todo. Não lhe retiro o mérito, como é óbvio, mas houve um pormenorzinho que os jornalistas teimaram em não nos contar. É que não basta ganhar quase tudo para ser a melhor do mundo. Para isso contribuiu também a opção estratégica de algumas adversárias (nomeadamente as australianas) em não participar na maioria dessas provas. É nestes casos que se pode dizer que ganhar 20 Taças do Mundo não é necessariamente ser a melhor de todas.
Com o João Costa talvez se possa contar uma história igual. Confesso que não sei, mas acredito que sim. O tiro não exige confrontos ao mais alto nível para uma preparação conveniente. Pelo menos, não tanto como outras modalidades desportivas. Então, a minha teoria é que muitos atiradores não participam nas provas pontuáveis para o ranking mundial, fazendo a sua preparação para os Olímpicos no recato das suas “casas”. Isto poderá justificar que um homem com o nº 1 no ranking fique em 33º na prova mais importante de todas. Ou isto, ou um verdadeiro descalabro.
Temos de observar que as expectativas geram apoio popular, geram envolvimento, geram audiências. Ainda para mais, quando o estatuto de herói está associado a uma marca comercial, que entra nas nossas casas a acompanhar estes heróis. Quanto mais deles se falar, mais essa marca se nos chapa nos olhos. Quanto mais heróis eles forem, mais sabemos que os hipermercados da Sonae existem. Assim, é importante identificar muitos medalháveis, impô-los aos portugueses antes da competição, aumentando as expectativas e, irremediavelmente, potenciando a frustração.

O Júri
Depois, com as expectativas no bolso, temos de julgar as prestações. E aqui vem a grande confusão gerada por uma sociedade moderna em que cada um fala do que quer quando quer. É como um velho Avô ter um blogue.
Os portugueses, que na sua esmagadora maioria só ligam a determinadas modalidades de 4 em 4 anos, não se abstiveram de comentar, de criticar, de condenar. Uns porque acham que há dinheiro a mais para o Desporto, outros porque dizem que há falta de verbas para o Desporto. E diz-se que quem não tem hipóteses de ganhar medalhas nem lá deve ir, mas também há quem tenha a lucidez de avisar que uma participação digna, mesmo que no último lugar, faz parte do espírito olímpico. Aproveita-se para crucificar tudo e todos, dos políticos aos atletas, passando pelos treinadores, os dirigentes e os jornalistas. E este tal Avô é tuga como os outros e também não deixa o direito em teclas alheias.
É claro que gostávamos que todos tivessem tido o sucesso do Nelson Évora. Ganhou. Mas nem todos podem ganhar. Há uma amplitude de resultados possíveis que faz com que o Desporto seja interessante.
A Naide teve um resultado péssimo, atendendo às suas capacidades. Foi um desaire. Faz chorar, claro, mas é Desporto. Os americanos, no mesmo dia, perderam duas provas de 4x100 porque deixaram cair os testemunhos. Tal como a Naide, também falharam as respectivas finais, contra todas as expectativas. A Blanka Vlasic tinha tudo para passear até ao Ouro e falhou. Os brasileiros passaram os primeiros dias a refilar com os seus judocas mais conceituados, que estavam todos a cair que nem tordos. Acontece. É Desporto! E ainda bem. Só assim podemos ver um canoísta do Togo a lutar pelo título olímpico no slalom.
Claro que é fácil olhar para um resultado e sacar algo de bom e algo de mau. Os críticos de dentes cerrados vão olhar para o mau; os anjinhos protectores irão buscar o bom.
O Nelson não bateu o record nacional. Para algum negativista muito corajoso isto podia ser motivo de crítica.
Os comentadores da televisão têm o grave problema de serem, normalmente, pessoas ligadas a cada modalidade. Faz sentido. Salvo em modalidades em que já temos jornalistas encartados pela via jornalística, é normal que se procurem dentro de cada desporto as pessoas que o vão comentar. Mas isso faz com que haja uma tendência positivista nos seus comentários. Os Jogos Olímpicos são uma janela aberta ao desenvolvimento da maioria das modalidades e criticar a presença olímpica dos seus atletas seria um tiro no pé.
Com isto, temos que a natação tenha sempre sucesso, Jogos após Jogos, mesmo que tenhamos apenas uma longínqua Final B por um Yokochi que nunca mais se repetiu. Porque há sempre alguém que bate um record nacional, porque há sempre alguém que ganha uma eliminatória. Neste Jogos, pediam-se muitos mais records nacionais, tendo em conta os fatos que nadam sozinhos e uma piscina especialíssima, onde quase toda a gente melhorou as suas marcas pessoais, ou nacionais, ou mesmo (e foram tantos!) mundiais.
E, na mesma onda, o meu amigo Virgílio do Nascimento (boa gente, e ex-treinador de um miúdo espectacular chamado Tiago Apolónia) foi comentando que a participação no Ténis de Mesa foi positiva, apesar de apenas um dos três participantes (actualmente todos profissionais na Alemanha) ter ganho uma eliminatória.
As modalidades em que Portugal é mais fraco hão de estar sempre nos Jogos (e ainda bem!) com o intuito de participar, de ganhar experiência, de se auto promoverem, sempre à espreita de um talento que possa surgir numa manhã de nevoeiro. Não vale a pena é andarem sempre a pintar a manta de outra cor, como aqueles que, de quatro em quatro anos, nos dizem “daqui a quatro anos é que vai ser”.

As Desculpas
O Judo desiludiu-me particularmente nestes Jogos. Não tanto pelos resultados, embora também por aí, mas mais pelas declarações que foram sendo feitas. A favorita Telma não pode esconder o desaire atrás da desculpa mais batida de sempre, que são os árbitros, nem na desculpa mais original de que todas se andaram a treinar a pensar em derrotá-la. Se assim foi, então é porque ela é mesmo boa, o que ainda lhe daria mais responsabilidade. Humildade, amiga, não te fazia falta.
Mas ainda houve o treinador que se queixou das recepções e cerimónias a que sujeitaram os atletas, coitadinhos. Pena só se ter lembrado disso no fim, depois da derrota. Se calhar, como treinador, podia ter pedido que o atleta fosse dispensado de algumas actividades extra desportivas. Será que o fez?
No judo, nem tudo foram declarações para justificar derrotas. Após vencer o campeão mundial João Derly, Pedro Dias disse que o humilhou (expressão pouco digna nuns Jogos Olímpicos) para vingar o facto de o brasileiro lhe ter roubado a namorada. É muito original. Talvez o COP pense nisso e insira nos projectos olímpicos umas namoradas de aluguer que depois traiam os atletas portugueses com os seus mais directos adversários, para que tenhamos mais sucesso no futuro.
Voltando às desculpas, ainda tivemos os atletas que baqueiam face à monumentalidade, da mesma forma que os cavalos baqueiam face aos ecrãs gigantes.
E são inevitáveis as queixas ao sistema, aos apoios, à falta de condições de treino. Claro. Muitas destas têm toda a razão de ser. Só que não deveriam ser sequência de maus resultados. As queixas deveriam ser feitas antes, nunca com o papel de desculpas, pois essas caem em sacos mais rotos que os do costume.
Tal como as queixas não devem ser deixadas para depois dos fracassos, também algumas declarações caem mal após os sucessos. Não gostei de ouvir a Vanessa criticar alguns colegas de comitiva na sequência da sua medalha. Fica-lhe mal. Criticar, tudo bem, mas não aproveitar-se de uma situação de empolgamento para o fazer. Era a única medalha nacional no momento e pareceu que dizia “empenhem-se como eu e podem vir a ter uma destas ao vosso pescoço”. Não gostei.
Estou sempre a atirar pedras aos jornalistas e, neste ponto, vou atirar mais um cascalhito. Muitas das declarações que os atletas fazem são arrancadas a ferros. Quem acaba uma prova e apanha com microfones na cara, sem ter muito para dizer, acaba por dizer disparates ou coisas sem interesse. Isso vê-se muito no futebol. “Estou contente com o golo que marquei mas o que interessa é a equipa”, por exemplo… ainda alguém tem pachorra? Mas o que é que o pobre homem pode dizer de interessante? Nos Jogos é igual, com a agravante de serem atletas pouco habituados ao protagonismo. Se acabo uma maratona entre o 20º e o 30º, sendo essa a minha posição em termos de ranking, e me perguntam o que é que achei da minha prova, querem que eu diga o quê?... terei de usar um chavão tipo “o importante é participar nesta grande festa e ter acabado a prova”. Depois critiquem a minha falta de ambição, se quiserem.
De qualquer forma, contentemo-nos, no meio de tanta incontinência verbal, por não termos tido um atleta como o cubano que deu um pontapé na carola de um árbitro.

De Bobo a Bode
Faço destaque para as declarações mais polémicas da comitiva lusa. Marco Fortes foi o bode expiatório de um momento mau que se estava a passar antes de cheirarmos finalmente as medalhas.
Acho vergonhosa a forma como trataram o homem. A opinião pública crucificou-o e os senhores dirigentes foram atrás, para safarem a própria face. Expulsá-lo da Aldeia Olímpica (mesmo que a expulsão tenha sido um convite a sair ou uma recusa de prolongamento da estadia) é reles, cobarde e injusto.
Dias antes das tristemente célebres declarações da “caminha”, um tal de Marco Fortes que ninguém conhecia era motivo de uma reportagem na televisão em que era dado como o grande animador da comitiva portuguesa. Dizia-se qualquer coisa como “pode não ser um candidato às medalhas mas já conquistou o título de atleta mais bem-disposto entre os portugueses”. Fortes era apresentado como um jovem alegre, sempre com declarações divertidas acerca de tudo e todos, um verdadeiro animador. Ficou registada a sua declaração em relação aos adversários, “Eles podem ser grandes mas não são Fortes!”.
Tal como não achei grande piada às graçolas que ele disse nessa reportagem, também não achei às que fez depois da prova. Mas, tal como percebi as primeiras, enquadrei as segundas. Tenho muita pena que a comunicação social, a opinião pública e, por arrasto, os dirigentes do COP, não tenham visto o mesmo. Tudo tem um contexto. Não se deixem levar pela crítica fácil! Era mais fácil bater num pobre lançador do peso que se escondeu numa piadola (mesmo que sem graça) do que noutros mais conceituados que se esconderam nos árbitros ou na Santa Providência.
Pois é, mas de Bobo da Corte a Bode Expiatório, foi um flash.

O Ausente
Pois, para mim, o atleta a quem tenho mais tendência para apontar o dedo é o Sérgio Paulinho. Não engulo. Aliás, é difícil engolir sem esforço qualquer história que tenha como ingredientes “ciclismo” e “medicação”. O homem (e o seu treinador, e a sua federação) está há quatro anos a receber dinheiro do COP para se preparar para os Jogos e é em cima da hora que se lembra que é asmático e que há pólenes na China. Medicou-se com algo que é permitido pela UCI e não pelo COI. Então e não há mais ciclistas asmáticos que foram aos Jogos? Então e quatro anos não eram suficiente para lhe ser administrada uma medicação correcta e permitida?
Não engulo. Nem eu, nem muita gente, incluindo, segundo me constou, o próprio Comité de Atletas Olímpicos, que aguarda explicações.
Se há dinheiro mandado à rua no projecto olímpico, este ciclista é a cara dele.

Os Dinheiros
As bolsas atribuídas aos atletas são, vê-se pelo caso do Paulinho, uma injustiça.
Injustiça de ter bolsas pelos resultados frios e crus e não pelas reais possibilidades que os atletas irão ter quatro anos depois. Obikwelu ou Paulinho tiveram uma medalha em 2004, é verdade, mas, um pela idade, outro porque a sorte não cai duas vezes no mesmo sítio, não eram evidentes medalháveis em 2008. Remuneração por resultados obtidos e não por resultados potenciais não se deviam chamar bolsas mas sim prémios.
O mais giro é o moço do taekwondo receber uma bolsa de finalista apesar de ter tido duas derrotas em dois combates e o Emanuel Silva, por exemplo, que falhou a final por 35 milésimos de segundo, não ter esse direito. E o Póvoa dos pontapés fica nivelado com o Gustavo Lima, que falhou o bronze por um mísero ponto.
Ah, e já agora, o Vicente Moura ganha 2500 euros mensais, o dobro do máximo que é atribuído aos atletas.

Orgulho Nacional
Os portugueses devem, apesar de todas as frustrações, estar orgulhosos da presença do nosso País nestes Jogos.
A canoagem não foi dominada por alemães, nem húngaros, mas sim por tugas! Nelos! Se o Nelo fosse um país tinha ganho as medalhas (quase) todas. O meu sentimento vermelho-verde exaltou-se a cada corrida, vendo o logo do Nelo a avançar a cada pagaiada, em quase todas as embarcações presentes.
E os fatos Speedo, que tornaram obsoletos os “pele-de-tubarão” e ganharam tudo o que foram medalhas (acho eu…)? Tugas! Sim, feitos em Portugal! Somos os reis da tecnologia subaquática.
O Manuel Pinho partilhou uma piscina com Michael Phelps, já com as oito bolachas douradas a reluzir no peito. Não foi o Laurentino Dias, foi o Manuel Pinho. Isto tem mais significado do que aparenta. Os jamaicanos dominam a velocidade, mas nós dominamos a economia. Ou, pelo menos, fazemos por fazer parecer que talvez a dominemos.

A Televisão
Para cascar mais um bocadinho na comunicação social…
O Nelson saltava para o Ouro. Os chineses preferiam mostrar, do Ninho de Pássaro para o Mundo, os 400 metros do Decatlo. Na Antena 1, para sorte minha, o jornalista relatava em directo os saltos que não estavam a ser transmitidos em directo pela televisão. Mas na RTP (curiosamente do mesmo grupo), o salto do Ouro foi relatado só quando os chineses mostraram a repetição. Eu já sabia; a maioria das pessoas não. O comentador da RTP vibrou como se não soubesse. Se calhar não sabia. Fiquei com dúvidas se estaria no Estádio, o que é grave.
E este é só o exemplo mais emblemático dos comentários que foram, em diversas modalidades, feitos a olhar pelo ecran e não in loco.
Alguém ouviu a tipa da rítmica? A rapariga drunfa-se, de certeza. Tinha reacções orgásticas a tudo, desde os fatos aos movimentos, desde as pontuações às reacções. Espectáculo! E o das águas bravas, que começava qualquer frase com um “e aqui” ou, para variar, “e ali”.
Tivemos, a certa altura, dois canais da RTP a dar Volta a Portugal a tarde toda (entre a prova e o folclore), em plenos Jogos Olímpicos, que só acontecem de 4 em 4 anos.
Mas, em contrapartida, fizeram directo para a única vez que o hino nacional soou em Pequim. É assim que se educa desportivamente um país - privam-nos de ver modalidades que já estamos habituados a ver só de quatro em quatro anos mas depois mostram (e exaltam, se interessar) o resultado final.
Os jornais desportivos não fizeram capas com os Jogos. O Aimar e o Reyes continuam a ser mais importantes que o Évora, ou os próprios Jogos em si. Pena o futebol não ter ido aios Jogos, apesar de terem mais meios que quaisquer outros, apesar de terem mais apoio que quaisquer outros, apesar de termos os melhores jogadores e as melhores escolas de jogadores da Terra e arredores.
Acabada essa seca que é o mais importante evento desportivo em todo o Mundo, voltamos agora ao futebol caseirinho, de que saberemos tudo em pormenor. Aleluia!

sexta-feira, julho 11, 2008

Prémios 2008

A época está a acabar. Sem os torneios habituais, por via de trabalhos de selecções. Apenas com o regresso dos nocturnos de praia, o que já não é mau.
E nesta altura, gostava de poder atribuir o “Prémio Avô 2008”, que o ano passado foi ganho pelo Carnaxide, mas não posso. Talvez mais tarde, quando se souberem (se se vierem a saber) os resultados dos campeonatos jovens (quais é que houve?) e veteranos (houve?). Algo me diz que, este ano, a batalha seria entre o CCCD e o Benfica, mas talvez nunca venha a saber. É pena.

Como também não há Gala e apetece-me fechar a época com galardões, ficam aqui os meus nomeados.
É uma lista pessoal. Seriam os meus votos, simplesmente isso. E vale o que vale. Por isso, seria giro que apresentassem os vossos votos. Valendo isso também o que vale.
Claro que são tendenciosos. Não tanto pela parte da simpatia, embora essa exista sempre nos condicionalismos de quem vota, mas mais por uma questão de dados. Ninguém viu todos os jogos. Pouca gente terá visto todas as equipas a jogar. Por isso, é natural que alguns agentes sejam beneficiados ou prejudicados na avaliação de cada um pelo facto de cada um ter visto mais ou menos jogos desses agentes. Até pode acontecer que eu tenha visto um único jogo de alguém e esse ter sido o seu melhor ou o pior jogo da época. Azar ou sorte. Paciência. Feitas as devidas advertências, azar e sorte fazem parte das regras do jogo. E o jogo (já sabemos) vale o que vale.
E depois também há a questão dos critérios. Valorizarei factores que outros valorizam menos, muito provavelmente. Ainda bem. Viva a diversidade.
Importante era que um painel alargado e devidamente legitimado fizesse a votação. E que as falhas de dados de cada um fossem colmatadas pela presença de outros. E que os critérios de uns se equilibrassem com os critérios dos outros. Mas, não havendo, cá está o meu boletim, guiando-me pelas categorias habituais (3 anos já fazem um hábito, penso eu).

Melhor Treinador
1º - Jorge Ramos (CCO) – Porque ganhou tudo. Porque está firme na Selecção principal.
2º - Catarina Miranda (LAC) – Porque continua a fazer o que sempre fez: formar jovens com gosto pela modalidade e espírito desportivo.
3º - Nuno Ferro (NCB) – Foi 2º. Treina a 2ª Selecção. É sempre uma referência para qualquer treinador que o queira mesmo ser.

Melhor Jogadora
1º - Alexandra Silva (CCO) – Sem dúvidas. Basta ter visto os 4 jogos dos títulos. A melhor e mais completa jogadora da actualidade.
2º - Carla Antunes (NCB) – Basta ter visto os tais 4 jogos para ver que não podia ser primeira. Mas os mesmos jogos, e mais ainda, mostram que está acima do resto da concorrência.
3º - Inês Biocas (CCO) – Sempre espectacular. Nem sempre consistente. Mas a 3ª, sem grandes dúvidas.

Melhor Jogador
1º - Miguel Costa (CCO) – Mesmo abaixo (fisicamente) do que já mostrou noutras alturas, continua a ser o melhor. Com a capacidade que demonstra, mais o entusiasmo, mais a dedicação, aliados à idade, parece que temos nº 1 por alguns anos. Ainda por cima os homens não engravidam.
2º - Henrique Marques (NCB) – Confesso que foi com surpresa que achei que foi o melhor jogador do NCB esta época. De certeza que, para uns, não foi o melhor e, para outros, não só o foi como não houve surpresa alguma. Fico então com esta minha opinião: Não esperava, mas é o melhor jogador do NCB neste momento.
3º - Jaime Ponciano (CCCD) – Continua a ser essencialmente um pistoleiro, que lança de qualquer lado, mesmo que ultra pressionado, de uma forma pouco ortodoxa, mas com uma concretização invejável. Só que já não é só isso. Tem evoluído em todas as outras funções e está muito mais completo.

Melhor Árbitro
1º - Jorge Alves (ESC) – Sem competição.
2º - Ricardo Ferreira (NCB) – É o árbitro mais rigoroso em fazer cumprir o que está escrito, mesmo que, às vezes, a letra da lei seja uma picuínhice. Caro que isto não lhe dá muitos amigos, mas o que se pede a um árbitro não é mais do que fazer cumprir as regras.
3º - Carlos Faria (NCB) – Tive algumas dúvidas neste 3º lugar. Vi pouco o Carlos este ano, mas o que conheço dele é melhor do que o muito que vi dos outros.

Jogadora Revelação
1º - Mafalda Mota (GDBD) – Sem dúvidas. Uma surpresa muito positiva este ano.
2º - Rita Mimoso (KLxP) – Por falta de hipóteses, guiei-me pela opinião de terceiros. Não me lembro de a ver jogar, mas consta que regressou em grande, após uns anos de afastamento.
3º - Joana Oliveira (NCB) – Já não é uma revelação, mas continua a surpreender que se aguente na alta-roda como gente grande.

Jogador Revelação
1º - Bruno Amaral (CCCD) – Mais produtivo que outras esperanças da mesma geração. E mais humilde.
2º - Daniel Amaral (GDBD) – O crescimento dos últimos anos não foi só físico. Grande melhoria atlética e na compreensão do jogo.
3º - Tiago Ralha (CCO) – Esta é uma modalidade em que é possível ainda que alguém não-jovem salte numa época ou duas para a Selecção Nacional.

Equipa Fair-Play
1º - CCO Sub-13 – Escolhi só os sub-13, porque são jovens e merecem. O CCO vem à frente porque mostrou que fair-play não é só em relação ao adversário. A integração também faz parte dos nobres princípios que deverão reger sempre esta modalidade.
2º - NCB sub-13 – Excelente espírito.
3º - CSD sub-13 – Idem.

Prémio Especial
GoKorfball / GoKids – Porque continua a fazer algo de qualidade pela modalidade e é a única instituição a fazê-lo fora da esfera Federação / Clubes, o que nem sempre é fácil.

terça-feira, julho 01, 2008

^Cu vi parolas Esperanto?


Naqueles tempos tão idos que, por não se saberem situar, se chamam bíblicos, um conjunto de homens, comuns mortais, quis chegar a Deus.
Juntos, no esforço colectivo, edificaram a maior torre que alguma vez o Mundo vira ou veria. Com aquela torre, chegariam a Deus.
E chegar a Deus era algo que os Seus intérpretes na Terra proclamavam como Bom, como desejável pelo Próprio. Portanto, aquela obra magnífica teria de ser do Seu agrado.
Mas não. Os intérpretes enganaram-se. Não era bem assim. Chegar sim, mas com moderação. Chegar a Deus só numa perspectiva espiritual. Não era para levar à letra.
Incomodado com uma torre que já Lhe fazia cócegas no nariz, Deus irritou-se. Ousavam então esses vermes mortais edificar algo tão magnificente que só se poderia igualar às Suas obras?!
Nunca! Deus é Deus. Podem aparecer torres que cheguem ao Céu, mas o Arquitecto, o Engenheiro, o Mestre-de-Obras tem de ser Ele. Ao homem estará reservado o papel de servente, de trolha, na melhor das hipóteses poderá ser um aprendiz.
Então, Deus destruiu a torre e pregou uma valente reprimenda a todos os que se lembraram de tal heresia.
Mas ficou intrigado… Afinal, tinha menosprezado o serzinho a quem tinha dado uns pingos de inteligência. O saber pensar era só para que algum ser na Terra O pudesse adorar. Todos os outros eram demasiado animalescos para o fazerem e só por isso tinha inventado um macaco pensante. Mas era só para isso, nunca para erigir torres até aos Celestes Domínios. Então, como é que tinham conseguido?
Pesquisou e chegou à conclusão que os homens tinham atingido um conhecimento que os poderia levar longe. Os homens tinham adquirido a noção de colectivo. Trabalhando em conjunto chegariam mais longe. Somando pensamentos, forças e motivações, o homem deixava de ser um pontilhado de seres insignificantes para se tornar numa massa poderosa.
Deus ficou preocupado. Se continuassem assim ainda iam descobrir o Corfebol, supra sumo do Colectivo.
Então, para cortar o mal pela raiz, impediu que o insignificantezinho pensante que pululava na Terra voltasse a entender-se entre si. Se era pelas palavras que o homem de unia, pelas palavras se separaria. Deus instituiu, nesse longínquo tempo bíblico, que jamais os homens voltariam a falar uma única língua. A cada povo, a cada grupelho, foi dada uma forma de comunicação incompatível com as vizinhas.
Desentendimentos, guerras, cisões, fracturas na massa poderosa sucederam-se, deixando Deus mais descansado com a impossibilidade de alguma vez Babel se repetir.

Mas o Homem, por vezes, suplanta deus. E dos Homens, com ou sem inspiração divina, nasceram, ao longo dos tempos, grandes obras. Obras palpáveis e obras pensáveis. E uma delas foi a união de esforços para repor a injustiça que deus tinha cometido no tal longínquo tempo bíblico.
Alguns pensantes resolveram coordenar esforços no sentido de instituir uma língua universal. Desta vez, porque o tempo nunca volta atrás, já não poderia ser uma única língua falada em todo o Mundo, por todos os Homens. Mas poderia ser uma língua que corresse em paralelo com as línguas de cada um. Não desapareceria a língua-mãe de cada povo, mas haveria uma língua-chapéu-de-chuva para todos. Para que todos se entendessem, onde quer que estivessem.
Várias hipóteses foram sendo lançadas. Já que se ia construir algo desde o berço, então que fosse perfeita, simples, fácil de ensinar. Deveria fugir às particularidades de alguma das línguas existentes, ou talvez aproveitar o que de melhor tem cada uma delas. Tarefa árdua, impossível, até.
Uma das hipóteses, talvez não a melhor, talvez não a definitiva, se ergueu de entre as outras e ganhou força. O Esperanto, de Ludwik Zamenhof, espalhou-se e colecciona adeptos um pouco por todo o Mundo. Estes, batalham pela vingança sobre Babel. Anseiam poder viajar, negociar, socializar, ao abrigo de um conceito linguístico comum.
Os holandeses que vêm jogar a Portugal esta semana, não teriam de falar inglês com os catalães. Os holandeses não deixariam de falar holandês entre si, mas teriam como 2ª língua uma que fosse comum aos portugueses, aos catalães, aos ingleses, aos chineses, aos russos, aos colombianos, aos moçambicanos, aos australianos.
Numa geração, punha-se toda a gente a saber Esperanto. As relações internacionais, fossem de que cariz fossem, saíam sempre a ganhar. Bastava vontade política. Bastava uma vontade política comum, una.
Mas a possibilidade de existir uma vontade política uniforme entre os povos é uma miragem desde que, num campo de batalha algures na Babilónia, num tempo distante e bíblico, Deus-Todo-Poderoso derrotou o insignificante homem e o proibiu de se entender entre si.